Outro dia li num livro do pedagogo Rudolph Lanz: "(...) constatamos empiricamente uma certa polaridade entre vida e consciência: um predomínio da vitalidade implica em consciência reduzida, ou, em outros termos, o desenvolvimento da consciência se faz às custas das energias vitais". Trocando em miúdos, se quer fazer uma coisa direito nesse mundo, dedique-se; se quer desenvolver sua consciência, ore e vigie, pois terá um gasto de energia fatal, cujo montante vai depender dos passos que o processo da tua individuação vai precisar dar.
Te escrevo hoje não porque tiveste febre (esta já sabemos compreender e até já gostamos quando ela vem: sinal auspicioso de cura e de queima benéfica do que não te serve mais), mas porque, às vezes, é árdua e doce, ambas em amálgama, o abraço desta missão.
Tem sido espantosa tua resposta aos nossos movimentos. Se a comunicação telepática vai diminuindo com o desenvolvimento da linguagem e a chegada dos três anos, ironicamente devo dizer que hoje me sinto absolutamente desnuda, perante tua sagacidade e tua sensibilidade, filha - ou somente agora atingi olhos pra isso? Às vezes, sinto-me aquém do que poderia fazer com isso tudo. Ao viver na concretude todas as manifestações espantosas do acesso que você faz ao meu inconsciente/consciente, ao mesmo tempo agradeço pelas "pistas" que me ofereces e, não raro, não sei o que fazer com elas. É como se tivessem me dado algo muito maior do que eu tivesse a capacidade de resolver, no concreto, contigo. É como se meu peito tivesse uma superfície pequena para o mar colorido que o invade.
Assisto, cá do meu lugar, de forma quase tranquila, uma alegria, uma sensibilidade, o reconhecimento de descaminhos em mim que se manifestam em ti e com isso a compreensão de outras pessoas, às vezes, uma clareza desconcertante, às vezes, aquele velho e desbotado estado condicionado que o cérebro, displicente, deixa-se ao me encaminhar a espelhar-me, implacável, em ti.
Às vezes, filha, estanco. Como canta Caetano: "Lua, lua, lua...es...tan...ca...Branca, branca, branca: a minha, a nossa voz, a tua, sendo um silêncio". Bem vindo este caos desagregador que, inabalável, sempre acaba por integrar.
Às vezes sou vibrante e criativa contigo, às vezes, as águas desse rio diminuem. Nisso tudo, busco mapear o que tu estás vivenciando na via direta de mim pra ti. Para que possas ser tu mesma cada vez mais. Olha, é tanto, tanto, tanto que me vejo, hoje, parada na calçada, vendo-me na passarela a desfilar, a transfigurar-me em mim também, outra de mim que é mais perto de mim do que nunca antes fui.
É como se fosse outra sendo-me eu mesma. Será que é bom ser filha de mim? Quimeras de perfeição.
Quero saber silenciar e saber a hora de falar, ter a clareza da percepção honesta, a humildade do meu tamanho, a generosidade de me permitir crescer - tudo, com completa franqueza, pela tua integridade e pelo vislumbre de que posso, de fato, estar cumprindo uma vida. Pelo planeta que vais habitar, autônoma, daqui a pouco. Como se faz isso? Não tenho de onde tirar cartas de sinalização, por isso, tem sido grande. Uma imagem fosse mais eficiente pra dizer tudo: muito de negro, muito de cores lindas - ausência e profusão de tons.
E ainda tem quem diga e também quem não tem coragem de dizer que ando desperdiçando meu tempo...
Bem, acordaste, vou lá.
Beijo
Tua Mãe
comadre amada, este seu relato dá uma dança, sagrada, é claro, porque vem da alma de mãe. preciso conhecer as músicas que você e marina tem cantado para então poder colocar nela os movimentos sagrados, do jeito que imagino que as deusas dançam. sua comadre, honrosa e orgulhosa que só.
ResponderExcluirLinda poesia de conexão com o SER!!
ResponderExcluirEntrega real, repleta de criatividade...
Humildade sincera...
Massa!
beijo carinhoso, Mari
Amiga Querida,
ResponderExcluirVocê me emociona com as suas desavergonhadas declarações de amor de mãe. Lindo texto, linda doação! Vá em frente!
Como diz mainha; "Mãe é um bicho besta!".
Bjus, bjus, bjus!!!
Tia Jopa.
SIM!!!!!!!!!
ResponderExcluirEmocionante mesmo esse teu jeito lindo de relatar o pessoal transbordando no universal.
Obrigada, Aninha, lembro bem destes momentos... e ja fazem 20 anos.
Hoje mesmo conversei com minha filhota. Continuo intuindo como o meu desabrochar continua abracado, dancando com a essencia que ela veio manifestar. Essencia tao generosa, poderosa.
Obrigada,
Luz e ternura,
Laura
Aninha,
ResponderExcluircomo é gostoso ler suas sábias palavras e sentir um pouco do que tu sente.
Hoje tenho vivido tudo isso, e vejo também, como é bom dedicar (a outros, desperdiçar) o nosso tempo com nossas crias e nos ver nelas.
Lindas!
Deslumbrantes!
Crianças amadas!
beijo!
Elaysa